Simon vs. a Agenda Homo Sapiens é o primeiro livro de Becky Albertalli, psicologa e autora autora norte-americana que desembarcou no Brasil em setembro para participar da Bienal Internacional do Livro em São Paulo pela Intrínseca. A obra, lançada em fevereiro pela editora, conta a história de Simon, um garoto de 16 anos que é gay e tem um relacionamento secreto na internet com Blue (pseudônimo de algum estudante da escola). Um belo dia, porém, Simon acaba esquecendo o e-mail aberto e passa a ser chantageado por Martin, que tira alguns prints das mensagens secretas do casal. Com muito humor e leveza, Becky escreve sobre uma bela história de amor, enquanto expõe, com muita sensibilidade, a crueldade dos padrões da sociedade em que vivemos: porque o certo é ser hétero e branco?

Quando Becky esteve no Brasil, o DAMMIT se encontrou com ela para batermos um papo. E, olha, ela é a simpatia em pessoa! Muita fofura, gente! O melhor de tudo? Conseguimos, com exclusividade, algumas informações sobre os novos livros da autora e a adaptação de Simon vs. a Agenda Homo Sapiens para os cinemas. Confira nosso bate-papo com ela:

O que você achou da Bienal do Livro? 
Foi uma experiência tão incrível! E bem diferente das outras feiras literárias que participei, vi tantos adolescentes e crianças! Eu amei, foi tudo tão adorável!

Simon vs. a Agenda Homo Sapiens é o seu primeiro livro. Como surgiu a ideia para escrevê-lo? 
Eu acho que toda vez que respondo essa pergunta, a resposta saí um pouco diferente. Eu não sei, acho que nem sempre entendo o meu processo de escrita. Mas, se me lembro bem, começou com a criação do personagem principal, o Simon. Ele surgiu na minha mente, e o restante da história foi se desenrolando.

Falar sobre a comunidade LGBT é complicado, não é? Como foi para você escrever um livro com essa temática? 
Sim, é complicado. Acho que falar sobre esse tema depende muito de quem você é e quem é o seu público alvo. E tem o fato de que é uma cultura que está sempre mudando. Uma das coisas sobre esse livro é que eu não sabia o que esperar, porque venho do Sul dos Estados Unidos, que é tradicionalmente conservadora. Mas tem sido uma surpresa, uma boa surpresa, a maneira como o livro está sendo aceito e estou muito feliz com isso. Você sabe, o nome, a capa e a própria descrição do livro foram feitos de uma maneira especial, para que as pessoas certas encontrassem essa história. Ou seja, pessoas da comunidade LGBT, adolescentes gays, pessoas que estão se descobrindo, ou que conhecem alguém homossexual, ou que ainda se simpatizem ou tenham uma conexão com a comunidade. E tem sido uma recepção maravilhosa, que mostrou para mim, inclusive, o quão incrível e rica é essa cultura. E isso não aconteceria se esse livro fosse lançado uns dez anos atrás, por exemplo. 

Eu terminei o livro e fiquei com a sensação de que a aceitação é bem mais simples do que imaginávamos… 
Bom, isso é um pouco complicado, porque cada pessoa que lê o livro, cada adolescente, está passando por uma situação e tem uma família e um ciclo social diferente. Para alguns jovens, pode ser fácil aceitar a si mesmo, mas, para outros, não. O Simon teve uma experiência fácil, se comparada com as histórias que ouvi e ainda ouço. Os pais do Simon, por exemplo, foram super tranquilos e compreensivos com quem ele é, e a maioria dos amigos dele também. Porém, eu não posso dizer que será fácil aceitar quem você verdadeiramente é, embora o livro passe essa ideia, porque isso depende muito de quem você é, com quem você convive e de onde você é. Sempre digo que em algum lugar deve haver uma pessoa como o Simon, que pode até ter a mesma idade e estar na mesma série que ele, mas que terá uma história e uma experiência completamente diferente. 

E o que você acha que é preciso acontecer primeiro: você se aceitar ou a sociedade te aceitar? 
É difícil falar para um adolescente que ele deve se aceitar, porque nessa idade tudo é confuso e intenso. Mas é importante saber que a sociedade vai mudar, ela está mudando, e caminhamos para um mundo mais humano, com mais aceitação e empatia. É crucial que essas pessoas saibam que elas não estão sozinhas, apesar de difícil, essa jornada é feita por milhares de jovens ao redor do mundo. Mesmo se a sociedade não estiver pronta para te aceitar, há outros caminhos, nós temos hoje organizações e grupos de apoio que ajudam a comunidade LGBT. E com a internet você pode se conectar com pessoas que te entendam e que são como você, e isso é muito bom.

Algum personagem seu é inspirado em alguém real? 
Eu acho que todos os meus personagens são inspirados em alguém! Por exemplo, o Simon é muito parecido comigo! [Risos] E outros personagens, como a Leah, a Alice e a mãe do Simon, também possuem algumas coisas da minha personalidade. Eu não percebi isso no começo, sabe? Mas depois eu li a história e fiquei tipo “Ai meu deus, eu sou igual a mãe do Simon!” [Risos] Mas, acho que o personagem que é mais parecido com alguém que conheço é o pai do Simon, que igualzinho ao meu pai! [Risos] Esses dias o meu pai leu algumas reviews do livro e ficou sabendo o que dizem sobre o pai do Simon. Ele me disse “Por quê todo mundo odeia o pai do Simon? Essa review é horrível!”, ao que retruquei “Ei pai, estou aqui! É o meu livro!” [Risos]. É muito engraçado!

Como é a sua relação com os fãs? E, principalmente, como você reage quando fica sabendo que o seu livro ajudou alguém a se aceitar? 
Ah, essa é uma pergunta tão boa! Foi uma surpresa o meu livro conectar, ajudar e impactar todas essas pessoas ao redor do mundo. E eu tento ser o mais acessível possível aos meus fãs, respondo cada tweet, cada e-mail e cada mensagem que recebo. Já fui uma adolescente, então sei como ás vezes uma história, uma série ou um filme pode impactar a vida de uma pessoa. Isso é meio assustador, mas procuro respeitar. Recebo uns e-mails com mensagens como “esse livro mudou minha vida”, e isso é tão legal! Esses dias eu recebi um e-mail de um garoto que tinha acabado de contar aos pais que era gay, e foi tão mágico poder fazer parte desse momento tão importante, sabe?

Aqui no Brasil, eu ouvi várias histórias parecidas! As pessoas realmente se identificaram com esse livro… 
Isso é tão bonito e especial! Os fãs brasileiros são muito queridos, eles são apaixonados e entusiasmados. E eu adorei isso! Conheci alguns dos meus leitores brasileiros que eu conversava pela internet e foi mágico! É uma coisa engraçada, quando você conhece alguém primeiro pela internet, e aí você tem esse momento, onde você está ansioso e nervoso para conhecer essa pessoa pessoalmente. É muito parecido com o que aconteceu com o Simon e o Blue.

Eu precisava dizer isso… muitas pessoas ficaram com raiva do Martin, mas eu não consegui sentir raiva dele. Isso foi proposital? 
Uma das melhores coisas de ser um escritor é que você vai atingir pessoas diferentes, com histórias e pensamentos diferentes. Então, eu conheci pessoas que queriam o Martin morto [Risos], conheci pessoas que tiveram um crush por ele, pessoas que só queriam que ele fosse feliz, pessoas que entenderam o que ele fez, pessoas que falaram “olha, ele não é um cara mal, mas eu nunca vou perdoá-lo”. É bom ter esses retornos diferentes, sabe? Depende muito do leitor, cada um vai ter uma experiência diferente. Então… não, não foi algo proposital.

O que você acha que aconteceria com Simon se o Martin não existisse? 
Se Martin não existisse? Nossa! Nunca me perguntaram isso. Essa pergunta é maravilhosa! [Risos] Bom, vamos lá. [Becky ficou um bom tempo pensando] Ele provavelmente iria sair do armário, talvez não no mesmo momento em que saiu, mas em eventualmente. Talvez um pouco mais tarde. Ele contaria para a Abby primeiro, depois para os seus amigos e familiares. O que seria diferente… bom, acho que ele não gostaria que toda a escola soubesse. Haveriam rumores, mas essas coisas acontecem. Com isso, acho que mudaria um pouco a dinâmica do relacionamento do Simon com o Blue. Se o Martin não existisse e não tivesse feito o que fez, Simon teria mais tempo para se descobrir.

Todo mundo quer saber mais sobre a vida do Simon. E você está trabalhando num spin-off do livro, né? O que você pode nos contar sobre esse projeto? 
Eu ainda não falei muito sobre isso, então essa é uma exclusiva! O meu segundo livro, que se chamará The Upside of Unrequited (O Lado Bom do Não Correspondido, numa tradução não oficial), será lançado em abril de 2017 nos Estados Unidos e ainda não sabemos quando ele será lançado aqui no Brasil [A Intrínseca já comprou os direitos da obra!]. É quase um spin-off de Simon, mas é ambientado em uma cidade diferente, e mostra a família e os amigos que Abby deixou para trás quando ela mudou de escola. Por conta disso, veremos muito pouco do Simon. Mas o meu terceiro livro, que estou escrevendo atualmente, será um spin-off de Simon vs. a Agenda Homo Sapiens sob a perspectiva da Leah. Ou seja, veremos muito do Simon, então está sendo algo muito divertido de se fazer! A história se passa durante o terceiro ano na Creekwood High School, ou seja, muitas coisas vão surgir. O grupo de amigos dele aumentou, então os relacionamentos estão mudando, e eles precisam descobrir o que querem fazer no próximo ano e que rumo querem tomar… e há o baile! Ah, essa parte é quase um fanservice, porque há uma cena linda com a proposta! [Risos] Simon e Bram vão fazer a proposta na mesma hora e no mesmo dia, e nenhum deles sabia disso! Vai ser incrível. E veremos mais do Martin, saberemos se as pessoas vão perdoá-lo e se ele ainda terá amigos.

E a história do Simon vai ser adaptada para os cinemas? Como está esse projeto? 
Sim! Está em processo de produção. Eu não tenho nenhuma participação no processo de escolha dos personagens, por exemplo, mas eles sabem e entendem das minhas preferências. Eu quero, por exemplo, que os personagens negros sejam interpretados por atores negros. O Greg Berlanti, que trabalha na equipe de Arrow, The Flash, Legends Of Tomorrow e Supergirl, e foi responsável pelo roteiro de Homem de Ferro, ficará responsável pela direção e o roteiro será assinado por Elizabeth Berger e Isaac Aptaker.

E você já leu o roteiro? Você está envolvida com algum processo do filme? 
Sim! A equipe toda do filme é maravilhosa. E os co-produtores são acessíveis e compreensíveis, e fiquei muito confortável com todo mundo. Eles me enviaram o roteiro e eu pude fazer algumas observações. Foi algo incrível de se fazer. E há uma história interessante sobre isso… no livro, alguns personagens vão na Waffle House, um restaurante que é bem famoso e icônico no Sul dos Estados Unidos, mas que não é conhecido na Califórnia, em Hollywood. Quando recebi o roteiro, eles descreveram a Waffle House como um drive-thru, sabe, aquele onde as pessoas compram a comida em seus carros? [Risos] Então eu escrevi uma nota: “A Waffle House não tem um drive-thru! Todo mundo que for do Sul saberá disso!” [Risos] Mas é tão fofo, eles vivem na Califórnia e não sabem disso! [Risos]

Matéria publicada no site DAMMIT - MTV